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13/08/2013
Papa Francisco está perturbando – e dividindo – a direita católica

 

 

 

A vitória vaticana contra os gigantes dos tribunais norte-americanos

Jeffrey Lena, o advogado que representa o Vaticano nos tribunais norte-americanos, ainda está derrotando mil gigantes quando se trata dos casos de abuso sexual. Na última segunda-feira, um juiz federal do Oregon rejeitou o caso John V. Doe versus Santa Sé, a última ação pendente em um tribunal norte-americano relacionado aos abusos sexuais que citava o Vaticano como acusado.

A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada no sítio National Catholic Reporter, 09-08-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Dois outros casos semelhantes, um no Kentucky e outro no Wisconsin, já haviam desmoronado. Em todos os três casos, os processos foram retirados a pedido dos advogados de acusação enquanto aumentavam as dificuldades de contornar as proteções garantidas ao Vaticano sob a Lei de Imunidades Soberanas Exteriores de 1976.

Até agora, o Vaticano lutou contra esses processos sem admitir qualquer irregularidade e sem pagar um centavo em indenizações.

A Rede de Sobreviventes de Abusados por Padres (SNAP, na sigla em inglês), o principal grupo de defesa em prol das vítimas de abuso, efetivamente prestou a Lena um elogio ao contrário, afirmando em um comunicado da última terça-feira que uma "advocacia inteligente e agressiva" era a culpada pelo resultado.

Tal advocacia, criticou a SNAP, "protegeu altos autoridades católicas de terem que responder no tribunal pelo seu repetido e imprudente sigilo e cumplicidade em um preocupante abuso sexual infantil e encobrindo o caso".

Originalmente apresentado em 2002, o caso do Oregon referia-se a Andrew Ronan, um ex-padre irlandês que pertencia aos servitas, que morreu em 1992. Documentos divulgados como parte do caso revelaram que Ronan se envolveu em má conduta sexual nos anos 1950, enquanto atendia um convento irlandês e foi então transferido para a escola de Ensino Médio St. Philip's, em Chicago, também dirigido pelos servitas, onde ele abusou de jovens em 1963 e 1964. Em 1965, Ronan foi novamente transferido para a Igreja de St. Albert, em Portland, Oregon, onde o processo alega que ele abusou do autor da ação, identificado apenas como "John V. Doe".

Ronan foi laicizado em 1966.

O núcleo do processo é a alegação de que Ronan estava agindo como um "agente" ou "empregado" da Santa Sé enquanto atuava como padre, e o Vaticano, assim, é responsável por danos provocados pelo seu comportamento. Quando o juiz Michael Mosman determinou em 2006 que ele iria considerar a base factual dessa alegação, ele provocou manchetes pelo indício de que, talvez, o muro da imunidade soberana do Vaticano estava começando a rachar. O Vaticano apelou durante todo o processo até a Suprema Corte, com o apoio do governo Obama, mas em 2010 a Suprema Corte se recusou a intervir, permitindo, como efeito, que Mosman seguisse em frente.

O inquérito de Mosman levou o Vaticano a dar o passo sem precedentes em 2011 de publicar online o que ele alegava serem todos os documentos em seu poder relacionados com Ronan. O mais antigo datava de 1966, um ano depois de ter ocorrido o abuso descrito no caso. Era uma carta de Ronan solicitando a laicização com base no que ele descreveu como "repetidas, admitidas e documentadas tendências e atos homossexuais contra o voto de castidade e o celibato do sacerdócio".

Tendo examinado o rastro de papel, Mosman determinou, em agosto passado, que o Vaticano não poderia ser considerado como o "empregador" de Ronan, que puxou o tapete debaixo da argumentação da acusação e preparou o terreno para a retirada da ação um ano depois.

Olhando para trás, há algumas formas pelas quais o Vaticano teve sorte na forma como esse processo se desenrolou.

Primeiro, as autoridades e representantes da Igreja, durante anos, têm tentado convencer as pessoas, com pouco sucesso, de que o catolicismo não é o monólito rígido e gerido de cima para baixo do mito popular. Agora, eles têm um tribunal federal dos EUA no seu registro que diz que os padres não trabalham para o papa, ao menos no sentido usual – eles não são contratados ou demitidos por Roma, eles não são supervisionados pelo Vaticano, seus salários não saem dos cofres vaticanos etc. Se um padre tem um chefe, trata-se do bispo local, e não do bispo de Roma.

Esse processo judicial provavelmente fez muito mais do que meia dúzia de seminários de pós-graduação em eclesiologia para fomentar uma compreensão realista de como a Igreja funciona, em outras palavras.

Em segundo lugar, o Vaticano escapou de um tiro no sentido de que foi o caso do Oregon que atraiu uma intensa revisão de um juiz federal, em vez do processo O'Bryan versus Santa Sé do Kentucky, que foi arquivado em 2004 e removido em 2010.

Os casos do Oregon e do Wisconsin foram arquivadas por Jeffrey Anderson (foto), o advogado de mais alto perfil que representa as vítimas de abuso clerical. O advogado, no caso do Kentucky, era um advogado local, que o abandonou porque não conseguia encontrar outras vítimas que ainda não faziam parte de litígios contra a Igreja. Portanto, os custos não valiam a potencial compensação no fim do caminho.

Se o processo tivesse seguido em frente, ele teria sido um teste fascinante por causa de uma diferença-chave no seu argumento subjacente. Ao contrário do Oregon e do Wisconsin, a ação judicial do Kentucky afirmava que os bispos, e não os padres, são "agentes" ou "empregados" do Vaticano, e, ao varrer os abusos para debaixo do tapete, eles estavam agindo de acordo com as políticas estabelecidas pelos seus supervisores de Roma.

Independentemente da opinião pessoal de cada um sobre isso, certamente há um argumento mais forte, tanto teológica quanto praticamente, ao definir os 5.100 bispos do mundo como "empregados" do Vaticano, em vez dos 412 mil padres. Se uma terceira parte neutra realmente colocasse a alegação debaixo do microscópio, seria mais difícil prever por qual caminho as coisas poderiam ir.

Dado o temperamento litigioso dos tempos, é perfeitamente possível que algum tribunal, algum dia, vai voltar a essa questão. Por enquanto, contudo, a equipe jurídica norte-americana do Vaticano pode respirar um pouco.

* * *

A última quarta-feira trouxe um lembrete de que a limpeza dos escândalos de abuso ainda está em andamento, com uma frase da Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano a respeito de um sacerdote de alto perfil da Sicília, chamado Carlo Chiarenza (foto).

Ex-reitor da catedral da diocese siciliana de Acireale e figura proeminente da cena local, Chiarenza havia sido acusado de abuso por um cientista siciliano chamado Teodoro Pulvirenti, que se pronunciou publicamente no ano passado, alegando que Chiarenza o molestou entre 1989 e 1991, quando Pulvirenti tinha 14 ou 15 anos. Para embasar tais acusações, Pulvirenti divulgou a fita de uma conversa com Chiarenza que ele gravou secretamente, na qual o padre parecia admitir o abuso.

Na quarta-feira, o bispo de Acireale anunciou que a Congregação para a Doutrina da Fé havia concluído uma investigação canônica e constatado que Chiarenza era culpado, condenando-o a deixar a diocese e proibindo-o de exercer qualquer ministério público ou de assumir qualquer cargo eclesiástico.

Chiarenza continua afirmando a sua inocência e os seus advogados dizem que vão recorrer ao sistema de justiça criminal italiano para tentar limpar o seu nome, na esperança de uma absolvição que leve a Igreja a reconsiderar o seu veredito.

Dentre outras coisas, essa reação ilustra uma impressionante ironia. Há não muito tempo, acreditava-se que os padres acusados sempre seriam tratados com mais cautela pela Igreja do que pelos promotores públicos. Hoje, os padres acusados, ao invés, ocasionalmente se encontram na esperança de que uma investigação civil leve a Igreja a recuar.

O contraste também parece sugerir o quanto as rodas já giraram.

 

Fonte:http://www.ihu.unisinos.br/noticias/522661-a-vitoria-vaticana-contra-os-gigantes-dos-tribunais-norte-americanos

 

 

Papa Francisco está perturbando – e dividindo – a direita católica

Por mais de três décadas, o Vaticano dos papas João Paulo II e Bento XVI operou em uma versão da máxima conservadora: "Sem inimigos para a direita". Enquanto os teólogos de esquerda eram silenciados e os bispos liberais a moderados eram postos de lado, os tradicionalistas litúrgicos e os conservadores culturais eram diligentemente cortejados e recebiam acesso direto ao palácio apostólico.

A reportagem é de David Gibson, publicada no sítio Religion News Service, 08-08-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Mas, em poucos meses, o Papa Francisco inverteu essa dinâmica, perturbando muitos na direita católica ao se recusar a manter os favoritismos e ignorando os itens preferidos da sua agenda, enquanto ele ressaltava o tipo de questões de justiça social que são próximas e caras dos progressistas.

"Eu, pessoalmente, achei muitos aspectos desse papado chatos e lutei contra esse sentimento desde o início. Mas eu dificilmente estou sozinho nessa", escreveu Jeffrey Tucker, editor do blog New Liturgical Movement, enquanto Francisco se expunha ao brilho da cobertura da mídia na sua recente viagem ao Brasil.

"Todos os dias e em todos os sentidos somos informados de quão glorioso é o fato de que os maus velhos tempos se foram, e os novos bons dias chegaram", escreveu.

Tucker e outros tradicionalistas que se dedicam a rituais da alta Igreja têm ficado especialmente irritados com o estilo simples – eles diriam simplista – de Francisco desde o momento em que o ex-cardeal Jorge Bergoglio foi apresentado ao mundo como o novo papa, em março.

"Como eu posso amar um papa que nem quer ser papa?", escreveu Katrina Fernandez, blogueira conservadora, em uma coluna sobre a sua decepção.

Desde a eleição de Francisco, a ansiedade na direita só tem aumentado, enquanto ele continua modelando um pontificado radicalmente diferente: pregando sobre os males da economia globalizada, enquanto lembra repetidamente os seus seguidores a cuidar dos pobres e marginalizados.

De fato, ele quase não mencionou o aborto diretamente, ou mesmo os direitos dos homossexuais, até ser questionado sobre os padres gays durante uma coletiva de imprensa improvisada no voo de volta do Brasil e, em uma frase ouvida em todo o mundo, ele disse: "Quem sou eu para julgar?".

Os católicos da "ala direita da Igreja", disse o arcebispo da Filadélfia, Charles Chaput, na véspera da viagem o Brasil, "não ficaram muito felizes com a eleição [de Francisco]". Chaput, um franco conservador na hierarquia dos EUA, disse ao National Catholic Reporter que Francisco "terá que cuidar deles também, por isso será interessante ver como tudo isso vai funcionar no longo prazo".

Na realidade, os riscos de Francisco decepcionar os católicos conservadores são altos, dada a presença desproporcional deles nos bancos e nos altos escalões da Igreja.

"Eles sustentaram lealmente a Igreja com doações e ativismo, e pode-se esperar que eles se oponham a qualquer mudança na direção que Francisco tem sinalizado", escreveu Michael D'Antonio, autor de um livro sobre os escândalos de abuso do clero, em um artigo para a revista Foreign Policy que perguntava: "Francisco é muito radical para o seu rebanho?".

"Mas esse grupo não pode sustentar a Igreja no longo prazo", disse D'Antonio, "e a Igreja precisa agora de uma figura capaz de preencher a lacuna entre o seu movimento para a direita e a realidade de que os ocidentais estão deixando a Igreja aos bandos. Esse problema requer um papa astuto, com a habilidade e o carisma para desfazer o ato de equilíbrio nas alturas de unificar esses dois impulsos discrepantes".

Nem todo mundo na direita, no entanto, está disposto a admitir que a sua influência possa estar em declínio, ou mesmo que Francisco seja realmente muito diferente de Bento XVI.

Ao contrário, muitos estão apresentando argumentos detalhados que, segundo eles, mostram que Francisco realmente não quer dizer o que a mídia e o público acham que ele quer dizer, acrescentando que a lua de mel do papa vai receber um banho de água fria quando os liberais verem que Francisco é tão ortodoxo quanto os seus antecessores.

Alguns chegam a pensar, como explicou a escritora Elizabeth Scalia na revista conservadora First Things, que Francisco pode estar manipulando os jornalistas a fim de insinuar a doutrina católica tradicional nas reportagens da imprensa dominante.

"Ao contrário do Papa Bento XVI, que já era desprezado pela imprensa quando ele era o cardeal [Joseph] Ratzinger, Francisco é a entidade surpreendente e não muito conhecida com quem a imprensa ainda não está familiarizada e, portanto, só está marginalmente preparada para combater", disse Scalia, que comparou as táticas do papa às do antigo manual militar chinês A Arte da Guerra.

Outros, como o repórter Raymond Arroyo, do canal católico EWTN, em artigo no sítio National Catholic Register, estão reciclando uma narrativa dos últimos dias do conturbado pontificado de Bento XVI e apontando o dedo da culpa para assessores de Francisco, dizendo que, "por mais que distanciem o pontífice do seu povo, os manipuladores podem proteger o papa desse tipo de má interpretação".

Mas outros católicos conservadores dizem que tudo isso parece mais desculpas do que explicações. Os sinais estão aí, dizem eles – o que pode não ser algo tão ruim para uma direita católica tão acostumada a um tratamento preferencial que muitas vezes identificou o papa com a própria Igreja.

"Na medida em que os católicos conservadores nos Estados Unidos encontram-se ativamente em desacordo com as ênfases do Papa Francisco (…), isso pode ajudar a curá-los/nos da recorrente tentação católica à papolatria", escreveu o colunista do jornal New York Times Ross Douthat.

"O ofício papal foi ocupado por muitos mais incompetentes do que gênios", concluiu ele, "e há uma razão pela qual tão poucos ocupantes da cátedra de Pedro aparecem na ladainha dos santos".

 

Fonte:http://www.ihu.unisinos.br/noticias/522657-papa-francisco-esta-perturbando-e-dividindo-a-direita-catolica

 

 

Franciscanos da Imaculada: eis as razões para o comissionamento vaticano

A decisão do papa de comissionar os Franciscanos da Imaculada os Franciscanos da Imaculada, como solicitado pela Congregação para os Religiosos ao término de uma visita apostólica iniciada no ano passado, com a regulamentação anexa do uso da missa antiga, desencadeou uma avalanche de reações midiáticas provenientes de ambientes tradicionalistas ou até críticos contra o atual pontificado, caracterizadas por uma tese de fundo: Francisco estaria dando marcha à ré com relação ao motu proprio de Bento XVI que, em 2007, liberalizou o uso do missal pré-conciliar. Tese prontamente desmentida pelo porta-voz vaticano, padre Federico Lombardi.

A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 08-08-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Quem publicou o texto do decreto de comissionamento com a cláusula anexa referente à missa antiga foi o site tradicionalista norte-americano Rorate Coeli. No dia 29 de julho, o blog tradicionalista Messainlatino também publicou o original da carta enviada enviada pelo comissário aos religiosos e às religiosas do Instituto.

A notícia, depois, foi circunstanciada, no mesmo dia, pelo vaticanista Sandro Magister, que a apresentava como a primeira "contradição" aberta com relação ao pontificado ratzingeriano. Depois, entrava em campo o site Corrispondenza Romana, agência de informação que é dirigida pelo professor Roberto De Mattei, próximo do mundo tradicionalista, autor de uma história do Vaticano II em que o último Concílio é apresentado como um evento de ruptura com a tradição anterior. O Corrispondenza Romana também se encarregou de uma coleta de assinaturas em apoio ao uso da missa antiga para os Franciscanos da Imaculada a ser enviado à Congregação para os Religiosos.

Finalmente, no dia 7 de agosto, Mario Palmaro e Alessandro Gnocchi, dois jornalistas próximos do mundo tradicionalista, intervieram no jornal italiano Il Foglio, com um artigo de título significativo: "Aquele tapa nos Franciscanos na Igreja de Francisco".

No texto, define-se a carta do comissário nomeado pela Santa Sé, padre Fidenzio Volpi, "modelada" no estilo dos "burocratas de Ceausescu" e zomba-se da mensagem de Francisco aos muçulmanos pelo fim do Ramadã, assim como da visita papal a Lampedusa. E se contrapõem os Franciscanos da Imaculada, "que são pobres e humildes sem ostentações", àqueles que se colocam "em favor da câmera e da lente fotográgica, como está na moda sob o novo pontificado".

"Procedimento draconiano"

O comissionamento é definido por Gnocchi e Palmaro como procedimento "draconiano", que visaria a destruir a força dos freis voltados a redescobrir e conservar "a missa de sempre" (expressão já codificada, usada como sinônimo para a missa pré-conciliar, que subentende duas tácitas consequências: a primeira é que o missal de 1962 corresponda à missa celebrada por dois milênios; a segunda é que a liturgia pós-conciliar não seja mais ligada à tradição).

Respondendo a uma pergunta específica do Vatican Insider a respeito do papel desempenhado pelos freis e pelas freiras do Instituto na difusão da tese do "repúdio de Bento XVI" que repercutiu nos sites e nos blogs, o agora ex-procurador-geral dos Franciscanos da Imaculada, padre Alessandro Apollonio, havia desmentido secamente qualquer envolvimento.

Mas permanece mais do que uma dúvida diante da evidente tentativa de transformar os problemas e as tensões internas ao Instituto acerca da fidelidade ao carisma original em uma batalha pública sobre a missa antiga e sobre o motu proprio "traído". Levando a entender, talvez, que o procedimento da Santa Sé foi tomado despreocupadamente ou com base em informações "falsas", como declarou o próprio padre Apollonio.

Vale a pena lembrar que os Franciscanos da Imaculada, um Instituto com uma forte marca mariano e missionária, nascido nos anos 1970, que se remete ao Pobrezinho de Assis e particularmente a São Maximiliano Kolbe, não nasceram no âmbito tradicionalista. Uma mutação, nesse sentido, por vontade do fundador, o padre Stefano Manelli, ocorreu depois da promulgação do motu proprio de Bento XVI que, em 2007, liberalizou a missa antiga.

Ao longo do Capítulo Geral de 2008, o padre Manelli havia tentado introduzir uma revisão das Constituições do Instituto para tornar obrigatório o velho rito nas missas conventuais. A iniciativa havia despertado uma oposição tal que havia sido retirada sem ser submetida a votação.

Nos três anos seguintes, no entanto, o uso do missal pré-conciliar tinha sido sugerido e, às vezes, de alguma forma, imposto. Em uma entrevista em 2010 em um blog francês, o próprio padre Apollonio admitia que o velho rito "é a forma da nossa missa conventual recomendado pelo nosso fundador". E o rito antigo também era promovido para as ordenações sacerdotais.

Sem normas escritas nem decisões assumidas pelo Capítulo Geral, o uso "preferido" da liturgia antiga foi fortemente recomendado nos conventos dos Franciscanos da Imaculada, e em alguns países foram adquiridos breviários bilíngues latim-inglês, a fim de favorecer a introdução da oração segundo o uso antigo.

Queixas internas

Isso fez com que um grupo de freis, os padres Antonio Santoro, Michele Iorio, Pierdamiano Fehlner, Massimiliano Zangheratti, Angelo Geiger, membros da comunidade histórica das origens e já envolvidos em papéis de responsabilidade no governo e na formação do Instituto (depois "punidos" pelas suas posições pouco tradicionalistas com várias transferências), em 2012, tenham recorrido à Congregação vaticana para os Religiosos pedindo que fosse recuperado o carisma original e não se impusessem a todos as posições tradicionalistas, incluindo aquelas que tendem a reduzir o porte do Concílio Vaticano II ou a apresentá-lo como um evento de ruptura inconciliável com a tradição anterior.

Em uma carta do padre Geiger, afirma-se que, dentro do Instituto, por parte de alguns dos seus principais expoentes, havia sido aprovada a ideia de que a "nova missa" fosse para os católicos comuns, enquanto a antiga fosse para "o católico mais sério com relação à fé", dando por óbvia a superioridade da "forma extraordinária do rito romano" liberalizado pelo Papa Bento XVI.

Um capítulo à parte diz respeito à atitude desconfiada de alguns responsáveis dos Franciscanos da Imaculada com relação ao novo pontificado, além disso plenamente compartilhada por aqueles sites e blogs comprometidos a fazer passar a tese dos freis "perseguidos" pelos "inimigos" da missa antiga e pelos seus promotores vaticanos.

Os dissidentes com relação à linha imposta nos últimos anos contestam que a missa antiga e o tradicionalismo se tornaram a única formação recebida pelos jovens seminaristas, e que as "opiniões" dos tradicionalistas se tornaram "normativas" no Instituto, em nome da lealdade ao fundador, quando, ao invés, não deveriam ser impostas à consciência de ninguém.

Mais ainda, os freis acima mencionados defendem que não houve nenhuma consulta nem um mandato do Capítulo Geral a esse respeito. Além disso, o tradicionalismo "não tem nenhuma relação com o nosso carisma" e "não é obrigatório segundo a nossa legislação".

A tudo isso, se somam também outros problemas relacionados com a condução do Instituto, ao papel crescente do ramo feminino, mais compacto em aderir à indicação para a missa antiga, aos problemas pastorais ligados às paróquias onde os Franciscanos da Imaculada exercem o seu ministério.

Decisão tomada por Bento XVI

Diante desse quadro, a Santa Sé, há um ano – e, portanto, no pontificado de Bento XVI –, dispôs uma visitação apostólica. Ainda antes do início da visita, no dia 9 de maio de 2012, o Papa Ratzinger, durante uma audiência pública, saudou "as consagradas, os seminaristas e os Freis Franciscanos da Imaculada, aos quais eu desejo que se alimentem da Palavra de Deus e do Pão Eucarístico para sentire cum Ecclesia". Uma referência importante que também ecoa agora na carta do comissário aos membros do Instituto.

O visitador apostólico preparou um questionário muito detalhado com relação a todos esses problemas, e, pelo que o Vatican Insider pôde apurar, a maioria dos membros do Instituto consultados se expressou em favor ou de um Capítulo Geral extraordinário ou de um comissionamento, confirmando, portanto, a existência das tensões, certamente não só devido apenas a um pequeno grupo de dissidentes que conseguiria falsificar a realidade.

Nenhum repúdio a Bento XVI

Portanto, parece totalmente incongruente apresentar a decisão do Papa Francisco como um repúdio do motu proprio do antecessor, como o Vatican Insider já destacava na reportagem do dia 30 de julho.

E é fácil de entender como a decisão da Santa Sé não foi tomada despreocupadamente, mas foi, sim, precedida por uma extensa coleta de informações. No site oficial dos freis, lê-se que o fundador padre "Stefano M. Manelli, com todo o Instituto dos Freis Franciscanos da Imaculada unido a ele, obedece ao Santo Padre e confia que, dessa obediência, venham graças ainda maiores".

Nas próximas semanas, o comissário vai verificar se o que vai prevalecer é essa declaração ou as pressões provenientes de expoentes do mundo tradicionalista, que estão sugerindo que os freis "resistam" e continuem celebrando "em sã consciência" segundo o rito antigo, sem pedir autorizações, apontando para o fato de que o decreto vaticano pôs a cláusula sem especificar quais são "as autoridades competentes" para dispensá-las.

 

fonte:http://www.ihu.unisinos.br/noticias/522624-franciscanos-da-imaculada-eis-as-razoes-para-o-comissionamento-vaticano

 




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