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29/11/2016
Sua Santidade se recusa a responder

Sua Santidade se recusa a responder

“Isso não é normal” – assim dizem os críticos de Donald Trump, enquanto ele se prepara para assumir a presidência. Mas, a República Americana é apenas a segunda mais antiga instituição que está enfrentando uma situação distinta e incomum no momento. O lugar de honra vai para a Igreja Católica Romana, que, com menos alarde (talvez porque o papado não tem um arsenal nuclear) também entrou em terra incógnita.

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Por Ross Douthat, The New York Times, 26 de novembro de 2016 | Tradução: FratresInUnum.com:

Há duas semanas, quatro cardeais publicaram o chamado dubia – um conjunto de perguntas, endereçadas ao Papa Francisco, pedindo que ele esclareça pontos de sua exortação apostólica sobre a família “Amoris Laetitia”.  Em particular, eles pediram-lhe para esclarecer se a proibição da Igreja em relação à comunhão para católicos divorciados em novos (e, aos olhos da igreja, adúlteros) casamentos civis continua, ou se a tradicional oposição da Igreja à situação ética se “desenvolveu” a ponto de cair no obsoleto.

O dubia começa como uma carta privada, como é habitual em tais pedidos de clareza doutrinal. Francisco não ofereceu nenhuma resposta. Mas, tornou-se pública pouco antes do consistório da semana passada em Roma, quando o Papa se reúne com o colégio cardinalício e apresenta os membros recém-elevados ao cardinalato. O Papa continuou a ignorá-la, mas tomou o passo incomum de cancelar a reunião geral com os cardeais (não poucos deles são silenciosos partidários dos quatro cardeais).

Francisco cancelou porque o dubia tinha deixado-o “fervendo de raiva”, como foi alegado. “Isso não era verdade”, escreveu no twitter seu colaborador próximo, o padre jesuíta Antonio Spadaro, pouco depois de responder aos críticos, comparando-os com o personagem de J.R.R. Tolkien, Grima Wormtongue, num tweet que ele logo em seguida apagou rosnando sua recusa de “trocar palavras distorcidas com um verme estúpido”.

Enquanto isso, um daqueles quatro autores do dubia, o combativo e tradicionalista Cardeal Raymond Burke, deu uma entrevista sugerindo que o silêncio papal pode exigir um “ato formal de correção” por parte dos cardeais – algo sem óbvios precedentes na história Católica (Papas já foram condenados por flertar com heresia, mas só depois de suas mortes). Essa foi uma linguagem forte; mas ainda mais forte foi a resposta do cabeça dos bispos católicos da Grécia, que acusou os autores do dubia de “heresia” e, possivelmente, “apostasia” por terem questionado o papa.

Enquanto isso, ele próprio continua em silêncio. Ou melhor, continuou sua prática de dar entrevistas e sermões lamentando a rigidez, farisaísmo e possíveis problemas psicológicos entre os seus críticos – mas continua se recusando a tomar uma atitude direta de responder às perguntas.

Não que haja qualquer dúvida real sobre onde o pontífice se situa. Durante um período de debate vigoroso entre 2014 e 2015, ele advogou persistentemente uma abertura à comunhão sacramental para pelo menos alguns católicos recasados sem a concessão da nulidade. Mas a resistência conservadora correu forte o suficiente para que o papa parecesse se sentir constrangido. Assim, ele produziu um documento, que ainda carece de esclarecimentos, a “Amoris Laetitia”, onde essencialmente tentou passar por cima da controvérsia, deixando implícitos os vários modos em  que a comunhão pode ser dada caso a caso, mas nunca dizendo isso diretamente.

Esta falta de objetividade é importante, porque dentro do Catolicismo as palavras formais do Papa, suas encíclicas e exortações, têm um peso que sinaliza e implicações que são carentes nas cartas pessoais. Elas são o que se supõe para exigir obediência, o que se supõe ser sobrenaturalmente preservado do erro.

Dessa forma, evitar clareza parece ter a intenção de se evitar um comprometimento. Os liberais então tem permissão pra deslizar para as experimentações, enquanto os conservadores preservam a letra da lei e os bispos do mundo ficam com a tarefa de escolher essencialmente seu próprio ensino sobre o casamento, o adultério e os sacramentos – que na verdade, foi o que muitos fizeram no ano passado, os de inclinação conservadora na Filadélfia e na Polônia, os liberais em Chicago, na Alemanha ou na Argentina, com inevitáveis atritos entre prelados que seguem diferentes interpretações da “Amoris Laetitia”.

Mas o estranho espetáculo em torno do dubia é um lembrete de que isso não pode ser uma solução permanente. A lógica do “Roma falou, o caso está encerrado” está profundamente enraizada nas estruturas do Catolicismo para permitir qualquer outra coisa, senão uma descentralização doutrinária temporária. Enquanto o Papa continuar a ser o Papa, qualquer grande controvérsia inevitavelmente vai subir de volta para o Vaticano.

Francisco deve estar ciente disso. Por enquanto, ele parece estar escolhendo a menor crise, que são bispos rivais e ensinos confusos sobre a maior crise que ainda está por vir (embora quem pode dizer com certeza?) se ele decidir presentear os conservadores da Igreja com suas próprias respostas pessoais para o dubia e simplesmente exigir que eles se submetam. Submissão ou cisma acontecerão eventualmente, é o que ele pode pensar – mas não até que o tempo e a operação do Espírito Santo tenha enfraquecido a posição dos seus críticos na Igreja.

Mas nesse meio tempo, seu silêncio está tendo o efeito de confirmar os conservadores em sua resistência, porque para eles parece que sua recusa em dar respostas definitivas poderia ser por si só obra da Providência. Ou seja, ele pode até achar que está sendo maquiavélico e estratégico, mas na verdade é o Espírito Santo impedindo-o de ensinar o erro.

Esta é uma hipótese teológica rara que pode ser facilmente refutada. O Papa precisa apenas exercer a sua autoridade, responder a seus críticos, e dizer aos fiéis explicitamente o que ele quer que eles acreditem.

Mas até que ele resolva falar, a hipótese está aberta.

Fonte>https://fratresinunum.com/2016/11/29/sua-santidade-se-recusa-a-responder/




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